Na aprazível aldeia de Vila da Ponte, desponta como um curioso símbolo de renascimento, a Casa da Floresta. Antes, entregue à indiferença das eras; agora, restaurada, apresenta-se como exemplo de uma vontade férrea e de uma visão que transcende o imediato.
A presidente da Junta, Júlia Verde, mulher de ar enérgico e palavras que exalam um pragmatismo infalível, desfiou à Rádio Montalegre a longa e tortuosa odisseia que culminou na recuperação do edifício. “Desde 2021 que esta casa tem uma nova vida”, declarou, com a satisfação de quem venceu batalhas contra as vicissitudes do Estado e os entraves de um processo que parecia interminável. Com efeito, antes que o restauro pudesse ser empreendido, foi necessário comprar a casa ao próprio Estado Português, uma conquista finalmente lograda em 2019, com a imprescindível intervenção da Câmara de Montalegre.
A história não se limita, contudo, a este desfecho feliz. Para salvar a Casa da Floresta, houve que sacrificar outro edifício: a antiga escola primária. Vendida, mas com uma condição estratégica – todo o dinheiro seria aplicado no restauro da casa –, tornou-se o catalisador de uma operação comunitária que envolveu mãos e vontades unidas. Assim, como uma peça de teatro bem ensaiada, cada personagem desempenhou o seu papel para que a casa ressurgisse como emblema do espírito coletivo.
Curiosamente, esta Casa da Floresta não se encontra imersa no abraço das árvores, como seria de esperar, mas incrustada na aldeia. “Sempre esteve no meio da aldeia, e não podia ser de mais ninguém senão nossa”, afirmou Júlia, como quem reafirma uma posse que é menos jurídica e mais afetiva. Em redor, há um campo de futebol, surgido há três décadas, fruto do esforço juvenil. Hoje, mesmo com melhorias no pavimento, ainda guarda as marcas das mãos que ergueram bancadas e moldaram o terreno, um monumento modesto ao labor de outrora.
Por fim, surge São Pedro – não o apóstolo, mas o santo protetor que, com invariável pontualidade, abençoa o fim de novembro e a Matança do Porco, evento que reúne os habitantes numa festa que mistura o sagrado e o profano. “Todos os anos temos bom tempo para a matança”, comenta Júlia, numa frase que revela a profunda ligação entre o trabalho árduo e a crença nas forças divinas.
Assim, a Casa da Floresta é uma metáfora para a aldeia em si que luta contra a erosão do tempo e da modernidade. Em cada pedra restaurada, em cada espaço reanimado, há um tributo às raízes de um povo que se recusa a ceder ao abandono. Uma lição, talvez, para quem esquece que a identidade de um lugar se constrói, sobretudo, na perseverança das suas gentes.
MJA
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